é sempre sobre o outro
eu já sei disso há bastante tempo
o outro é o protagonista
e a história se desenrola a partir daí
o outro tem suas demandas
e é perfeitamente aceitável
todos temos demandas
todo mundo precisa de alguma coisa
o outro precisa de mim
o que sempre me fez
me sentir necessário
necessário
essa palavra é pesada
e ninguém percebe
o peso que ela trás
ser necessário
me obrigou a
ser vivo
ser vivo em um lugar
que eu nunca quis
ser vivo
nunca quis
ser vivo
mas eu sempre
quis entregar
me entregar para o outro
e me sentir não apenas
útil mas com certeza
necessário
nunca quis ser vivo
e sempre quis ser
necessário
merda de dicotomia
um lado a inexistência
o outro uma obrigação
de existir
hoje eu não quero ser necessário
mas eu morro de medo de morrer
eu quero ser vivo
quero muito ser vivo
e viver às minhas custas
viver as minhas histórias
as minhas derrotas e vitórias
mas meu corpo não quer nada disso
meu corpo não quer ser vivo
e o outro ainda demanda
mesma vida outros conflitos
um corpo que não quer existir
uma mente que quer ser viva
o outro que quer que eu seja necessário
e eu nem aí pela necessidade do outro
a necessidade não diz mais
que a minha vida tem valor
mas o outro tem demanda
a vida tem demanda
o corpo tem demanda
eu tenho demanda
necessário
me sinto em uma caverna
passando por um espaço
onde só meu corpo cabe
e na fraqueza me movo
meu movimento é lento
os músculos doem e
tudo é hostil
o outro e eu mesmo
toneladas de terra
o ar rarefeito
espremido com
o seguinte objetivo
ir em frente
seguir vivo
eu preciso sair daqui
a ansiedade vence
o pânico vence
o outro perde
se decepciona
demandas mal cumpridas
versos mal escritos
noites mal dormidas
almoços mal feitos
comida mal digerida
mal e mal vivo
malemá
malemá
escrevo
o que
sinto
aí já vem a vontade de apagar tudo
porque eu tô dizendo que tudo é uma merda
porque existe o outro
porque existe demanda
porque existe um corpo
a culpa nunca é minha
eu não consigo me vestir culpado
a culpa é minha sou todo culpa
eu só me visto
culpado.