as possibilidades me irritam
é como se eu estivesse esperando mudanças
desde a primeira vez que bati no peito e disse
quero ser foda
o mundo é uma caixinha de surpresas
ao passo que muito depende-se da sorte
e de maturidade e esforço e habilidade
e as coisas são monótonas há muito tempo
o tempo todo trens vindo em minha direção
e me estraçalhando ocasião atrás de ocasião
como se meus pés fossem imãs
e eu não pudesse sair desses trilhos
que só me levam
cansei de apontar pro destino dizendo
eu quero
como uma criança que escolhe um presente
os atropelamentos recorrentes me mostram que nada é fruto do esforço
embora eu ainda me apegue a estes termos
porque a sociedade assim pede
e senão eu deixaria de me esforçar
e esperaria que as correntes de vento
me levassem para o melhor futuro possível
as possibilidades se abrem nos meus olhos
eu gosto delas e ocasionalmente me pego apegado
apaixonado por uma ideia hipotética que está longe do meu trilho
sou atropelado
mas as possibilidades existem
e eu atropelo algumas delas
e agradeço a sorte
e o acaso
como se nenhum dos quilômetros ultrapassados
contassem em nenhum momento
como se o caminho não fosse a causa do presente
as possibilidades me irritam
as estudo como um matemático
e depois como um psicólogo
e só então um arquiteto
e logo um cozinheiro
e um doente
e por fim morador
de rua
as possibilidades não dependem desses estudos
mas de outras possibilidades que dependeram de possibilidades mais antigas
e minha análise profunda nada mais é que justificar a mim mesmo minhas próprias escolhas
possivelmente
nada disso
faz sentido
sigo no trilho
parado
e andando
na maior monotonia
que um atropelamento
pode ter