sexta-feira, 28 de junho de 2013

Homo sapiens sapiens sapiens sapiens...

Disse, com a voz pra janela, pro vento me trazer as palavras de tão longe, que não me aguentava mais. Disse que se acostumou com as crianças e que não queria saber o que eu achava da situação brasileira, e nem o que ela mesma achava. Chega de tecer opiniões. Quero só os meninos, ela disse por último. Então fez-se o silêncio. Por quase sete centésimos de segundo, cheguei a preferir que a televisão estivesse ligada e esse silêncio não gelaria todo o ar que tinha em volta de mim. Mas não, eu odeio televisão. Aquela da sala é pra assistirmos filme e jogarmos video game. Não pega nenhum canal.
Mas, por quê? O sonâmbulo que acorda já em pé, num susto, não entende absolutamente nada. Como assim?
Eu vou embora, ela continuou. Não! Por que vai embora? Eu tô cansada de pensar pra te agradar. Me explique, eu respondi. Eu não preciso explicar nada pra você, é exatamente disso que eu tô cansada. De que eu exija explicações? Você acha que eu fico pegando no teu pé por explicações? Sou tão chato assim? Não quero mais explicar nada pra ninguém. Não quero mais ter opinião. Não quero mais ter que fazer minha cabeça funcionar às 7h da manhã enquanto você faz café e começa a conversar como se estivéssemos numa mesa redonda, debatendo sobre a porra evolução da espécie ou entendendo como funciona a merda do filtro da cafeteira! E você não gosta de conversar? Claro que gosto! Eu não te entendo. Qual é o meu defeito? Dá pra concertar? Vamos melhorar o que está ruim? PARA! É ISSO QUE EU NÃO AGUENTO MAIS! EU NÃO QUERO PENSAR PRA TE RESPONDER! Você não quer pensar nunca mais? NÃO! E com quem você vai se relacionar? Porque você vai conseguir viver sem pensar quando estiver sozinha, mas alguém vai aparecer... Quero só as crianças. Não quero mais ninguém. O filtro da cafeteira... O que tem? A gente só conversou sobre o filtro da cafeteira pra explicar pro piá como funciona. É ele que quer saber porquê o céu é azul, o que é o amor e como faz um lápis. Por quê? Por quê? Por quê? Não comigo. Quer dizer que com você eles não pensam? Não. O que vocês fazem? Sorrimos, brincamos, eu faço carinho neles... Que nem gatos? Quem nem nós dois, mas há muito tempo atrás. Que nem gatos...
Ela começa a arrumar a mala. Eu tento argumentar. Você percebe que você está sendo inconveniente? Inconveniente porque não deixo você viver uma loucura que te bateu sabe lá Deus quando...? Hoje de tarde, que seja... Eu disse que não quero mais pensar e você fica aí, abanando esse cérebro na minha cara, dizendo "PENSA COMIGO!" Sim, você não tá pensando no que tá fazendo. Ou tá? Porque se estiver, fico mais preocupado ainda... Claro que não estou. E você devia fazer isso também. O que? Ir embora? Parar de pensar. Agir. Falta atitude? Sobra pensamento. Então você acha que eu preciso parar de pensar e agir? Sim... Eu não consigo pensar numa resposta. Não consigo pensar em nada coerente. Ela fecha a mala.
Vai no quarto dos meninos: Vamos? E o mais novo desliga a televisão. O outro pede pra ela esperar. Esperar o que? Só estou terminando de passar um negócio pro video game, ele diz. Ela fica na porta, batendo o pé. O mais novo se aninha nas pernas dela. O mais velho desliga o computador e todos saem do quarto. Cada um com sua mochila já previa e calculadamente preparada.
Tchau, pai. Até amanhã. O primeiro diz. Me dá um beijo na bochecha. O mais novo não diz nada, só me beija. Estou indo pra casa da minha mãe. Pode ligar lá, pra falar com os meninos. Não vai me proibir de vê-los, vai? Que horror. Você acha que eu sou o quê?, sorrindo aparentemente sem jeito. Me deu um selinho rápido e foi abrindo a porta.
Levantei do sofá e segurei-a pelos braços. Tentei beijá-la, mas ela se contorce como uma cobra arisca, seguro-a e nossas línguas se tocam numa breve e casual dança. Ela sorri um sorriso vermelho e envergonhado da porta do elevador e desaparece.
Me deixando só com o corredor frio e vazio.
A luz automaticamente se apaga.
Tranco a porta.
Bato no fundo da carteira e só sobra um último cigarro.
Apago a luz.
E me sobram os estalos da ponta em chamas.

Percebo que meu cérebro
não para.
Não
para.

Esboço um
sorriso,
pensando que há
um quê de
patético
em só
pensar.

sábado, 22 de junho de 2013

Medo

na minha extensa solidão
já não guardava mais nenhum
tipo de esperança
só o medo
de morrer
sem ser feliz

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Escambo

fica com os meus olhos
que o sorriso eu já te roubei