domingo, 9 de julho de 2017

O inseto, a religião e os pormenores

ocasionalmente o cérebro para
e escolhe outros focos aleatórios
numa viagem psicodélica que mistura
sonho e realidade

uma hora as coisas ficam extremamente confusas
quando de repente não se sabe o que se está fazendo

em uma curva abrupta estou ciente que sou viciado pela palavra
a palavra e a língua e a lógica infalível
que falha intermitentemente

e logo creio que a língua é a melhor das leis
e misturo as coisas como se direito e legislação e linguagem
conseguissem nos organizar
nessa sociedade de caos

a melhor das leis
que convive com a liberdade que o mundo exige
as palavras que saem confusas porém livres

é que as pessoas esquecem do valor da palavra
e as balbuciam como se fossem heresias rotineiras

aqui a palavra pesa como todo o resto
uma atmosfera de toneladas que me obriga escolhe-las com o cuidado
de quem escolhe produtos de limpeza

quando vale o mais barato
o mais bonito
e o mais cheiroso

vale a palavra que pouco fere mas que muito diz
a que me conforta quando o desespero surge e explode

pois em um segundo toda a calma acaba
como a chama da cabeça de um fósforo
e dessa extinção surge algo muito maior
com a intensidade do fim dos tempos

o fim vem como um caminhão sem freios
e atropela tudo que há de coerente

e num processo vazio
me esvazio
e escolho as leis
e as palavras
e no próximo segundo
sou vazio

sem medo nem coragem
sem qualquer esperança ou exaltação
sem paixão ou carinho ou verdade ou justiça

só a palavra
que exprime tudo
espreme tudo
sobra o bagaço
seco e esturricado

ensaio um sorriso
que sai apenas no lado direito da boca

parece que não tem fim

parece que não é um túnel
pra que haja qualquer sinal de luz
no fim dele
e a metáfora nos convir
e a palavra se torna esperança

a palavra é escuridão
e a escuridão é a realidade
o negro verdadeiro que absorve toda luz

perdido de sentidos
todos confusos enquanto me debato
entre desespero e prazer
o prazer de ver e sentir e ser
porque há certa beleza nas coisas todas

há beleza na palavra
e na imagem
e na lei

há beleza no sofrimento
e na desgraça
e na morte

definitivamente há beleza em todos os cantos
onde nenhum dos sentidos faz sentido
onde nada de nenhum modo faz sentido algum

essa hora estranha em que as coisas se confundem
mentira
e verdade
e palavra

a palavra verdade que é a ordem de Deus
os versos viciados que remontam milênios de abrigo
de guerra e discórdia
de voláteis agrados e desagrados

e eu relutando em lutar
lutando em relutar
lutando a luta por hábito inseguro
inseguro de mim
e do mundo todo
e da palavra
que sai como verdade
e dessas voltas que não me levam a nada
senão ao cul-de-sac

volta meia volta volta e meia volta aqui e me salva
ctrl + s antes de me perder
porque me perder é inevitável
o arquivo se corrompe
a palavra se esgota
a verdade se apavora
o mundo continua e vence
os pobres perdem
me sinto pobre

pobre de tudo

pobre de alma
pobre de grana
pobre de dignidade
e de esforço
pobre de mim que
não se aguenta mais
enquanto julga e é julgado

o julgamento começa e eu me apego
culpado por favor
me prende e me tira daqui

a palavra
só tenho a palavra
e a verdade
e essa confusão abstrata
que me faz
perder